POR QUE DEVO ME PREOCUPAR COM O INCOTERM?

– Envia essa carga para o Cazaquistão. É urgente.

– Mas qual o Incoterm?

– Não tenho idéia, só sei que nós somos responsáveis pelo frete.

Se você já vivenciou algum desses dois diálogos, você faz parte do grupo de profissionais de comércio exterior que sofre com a falta de conhecimento de todos os envolvidos nas operações sobre esse termo estrangeiro tão falado e pouca difundido.

Incoterms é a abreviatura de “International Commercial Terms” ou Termos Internacionais de Comércio. Foram desenvolvidos pela primeira vez no ano de 1936 pela Câmara de Comércio Internacional (ICC) na tentativa de simplificar os problemas de comunicação envolvidos nos negócios internacionais. Eles são usados até hoje e revisados periodicamente, sendo a última versão desse ano, 2020.

Atualmente são 11 siglas que determinam onde começa e termina a responsabilidade do importador/exportador nas operações internacionais. Para entender a fundo cada uma delas, é importante estudar e se aprofundar no tema, para então ter clareza e poder analisar corretamente qual incoterm melhor se aplica à necessidade da sua operação.

Hoje vamos falar sobre a importância dessa análise e como isso afeta diretamente os custos e qualidade do seu processo.

De modo prático, podemos separar os incoterms mais usados em dois grupos:

  • Iniciados com a letra C (CIF, CFR, CIP e CPT) e D (DAP, DPU,DDP) – frete e/ou seguro internacionais prepaid, ou seja, pagos na origem.
  • Iniciados com as letras F e E ( FOB, FCA e EXW) – frete e/ou seguro internacionais pagos no destino.

Mas o que isso significa na prática?

Vamos analisar o mesmo incoterm CIP aplicado aos cenários de importação e exportação.

Em uma importação CIP, estamos dizendo que concordamos em comprar uma mercadoria do exterior em que o meu exportador é responsável por contratar o frete internacional e o seguro dessa carga.

Na prática: Você, como importador, precisa receber uma documentação que comporte essas afirmações. O seguro e frete devem estar preferencialmente destacados na sua invoice, ou então será assumido que estão dentro do preço do produto, mas mesmo assim devendo ser informados na hora de registrar sua importação. Você não tem o controle das informações, portanto, fica dependente do seu exportador para saber detalhes como quem será o seu agente de cargas no Brasil e quando a carga irá embarcar, por exemplo.

Já em uma exportação CIP, vemos o outro lado da moeda.

Eu, como vendedor, procuro contratar o frete mais barato possível pois terei que desembolsar esse dinheiro, mesmo sendo ressarcido depois, e o seguro internacional será o de cobertura mínima, na maioria dos casos, pois quero reduzir custos na operação e assim poder dizer que entreguei um trabalho eficiente e com baixo custo para todos. No entanto, minha obrigação termina depois que essa carga embarcar, e não preciso me preocupar se a rota escolhida terá 10 conexões até o destino final e se isso vai atrasar o meu cliente, pois ele concordou que eu escolhesse o frete.

Viu só como não é tão simples assim?

Quando analisamos uma operação de comércio exterior, jamais podemos reduzir tudo a números. Precisamos pensar no leadtime que temos para trazer ou embarcar uma mercadoria, na satisfação dos envolvidos, nos riscos mapeados, mas principalmente, em atingir o objetivo final procurando estar em harmonia com todos esses fatores.

No entanto, sabemos que na prática muitas vezes a decisão não está nas nossas mãos. A negociação vem de cima, a escolha é de terceiros. Se este for o caso, você pode sim apresentar números bem convincentes para mostrar aos envolvidos a importância do que estamos falando:

Imagine a continuação do cenário descrito no começo desse texto.  Existe uma carga vindo da Inglaterra em que o exportador é o responsável pelo frete. Na cabeça do negociador, ele se livrou de mais um trabalho ao incluir o frete na negociação do produto. Em paralelo, o que pode acontecer é:

  • O exportador é o responsável por emitir a documentação. Como ele contratará o frete, não se dá o trabalho de lhe enviar tudo antes do embarque para aprovação, pois ele já agilizou toda a operação e entregou os originais junto da carga. Quando você finalmente  tem acesso aos documentos, vê que a invoice está sem a informação de seguro e assim não sabe qual valor declarar. Ao mesmo tempo, você percebe que o packing list está com o peso diferente do conhecimento. Qual o valor aduaneiro correto? Qual o peso certo? Tudo isso impacta diretamente em quanto você como importador irá desembolsar.
  • O exportador da Inglaterra é desorganizado e não passa as informações do embarque. Você não sabe quando sua mercadoria vai chegar ao Brasil e nem com quem falar. Quando consegue essas informações, a mercadoria já está há dias aqui e você já passou do segundo período de armazenagem sem sequer iniciar o processo de desembaraço. Mostre o cálculo desses períodos extras. Veja se não existem outros custos que poderiam ter sido evitados, como a demurrage, e apresente todos eles com seus argumentos.
  • Como você não é responsável por aprovar o conhecimento de embarque, só vê a cara desse documento quando o processo está quase no fim, e acaba descobrindo que o agente pôs o frete como collect, ao invés de prepaid, e o exportador deixou passar esse erro. Infelizmente a carga já está no Brasil e cai em canal vermelho, com exigência de retificação do conhecimento e do sistema, para poder liberar a mercadoria. Calcule o valor da multa por informação incorreta e a armazenagem extra que isso ocasionará.
  • Custo do tempo perdido: e se já não bastasse toda essa dor de cabeça, você ainda tem um prazo a cumprir. Quanto custou cada dia de fábrica parada sem produzir porque sua matéria prima atrasou? Ou quanto valeram os dias de atraso de um início de projeto?

Isso tudo se chama análise e gerenciamento de riscos. Toda e qualquer operação de comércio exterior deve possuir essa etapa que antecede o início do processo e está diretamente ligada à escolha do incoterm.

Depois de todos esses argumentos, pode parecer que qualquer operação prepaid na importação seria um caos. Ou que vender com incoterms C é um prejuízo para o cliente. Com toda certeza não é o caso. Jamais podemos afirmar como uma operação vai ocorrer sem conhecer os participantes e suas formas de trabalhar. Você também pode encontrar exportadores exemplares ou importadores excelentes, que não lhe trarão nenhuma dor de cabeça. O importante sempre é escolher parceiros que dividam e entendam a responsabilidade da logística internacional e te apoiem quando algo der errado, pois isso é mais comum do que se imagina.

Portanto, a importância  da escolha do incoterm está baseada em fatores chave que podem ser analisados respondendo as perguntas abaixo:

  • Qual a minha responsabilidade nessa operação?
  • Qual o meu objetivo final? Entrega ou satisfação?
  • Qual o meu leadtime?
  • Preciso passar follow up para atores externos com frequência? Preciso ter o controle das informações prontamente?
  • Quais são os custos que esperamos ter?

E por fim, compare. Sempre existe mais de uma opção de cenário e faz parte do nosso trabalho como atuantes no comex saber visualizar os prós e contras de cada um. Lembre-se : qualquer um entrega um trabalho, mas nem todos entregam um bem feito.

Artigo escrito por Julia Caetano:

Julia Caetano é formada em Relações Internacionais pela ESPM Rio e cursa pós-graduação em Gestão de Projetos. Amante do mercado externo, trabalha na área há 4 anos, além de ser produtora de conteúdo para o ComexLand.

Julia Caetano

Julia Caetano

Formada em Relações Internacionais pela ESPM Rio e cursa pós-graduação em Gestão de Projetos. Amante do mercado externo, trabalha na área há 4 anos, além de ser produtora de conteúdo para a ComexLand.